segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Café e livro velho




Beatriz custou a acordar naquela manhã. Se revirou na cama alguns minutos, tentando encontrar por ali algum punhado de sono, mas não achou. Sentou-se na cama, e suspirou: esse seria um daqueles dias nostálgicos com gosto de café e livro velho. Daqueles que mesmo com sol e calor lá fora, você sente aquele frio na espinha. Na verdade, Beatriz se sentia imersa num profundo Outono. Despedaçando restos secos do passado numa tentativa desesperada de abrir passagem pra uma primavera longínqua que ela não sabia quando, mas tinha certeza que iria chegar.

Pulou da cama pro chuveiro. Tentou lavar dali toda a angústia. Quinze longos minutos depois, saiu de lá enrolada numa toalha vermelha, secando os cabelos com a toalha que Pedro sempre usava quando estava por ali. Ainda friccionando freneticamente a cabeça, passou pela estante do quarto, e puxou um livro da Jane Austen. Pelo estado que estava aquele livro, parecia velho o suficiente para o dia de hoje. Talvez fosse um transtorno psicológico, mas pra Beatriz angústia combinava bem com livro velho. Provavelmente o cheiro de livro velho fosse uma forma involuntária dela se lembrar que as mágoas do seu passado se foram, mas as cicatrizes ainda doíam. Sacou da gaveta uma camiseta, vestiu o jeans que tinha jogado em cima da cadeira na noite anterior. Saiu trotando pela escada, agarrada com Orgulho e Preconceito, que já tinha lido tantas vezes que o livro estava só bagaço. Tomou um copo de café, e saiu caminhando pelas ruas que conhecia tão bem, mas que naquele dia pareciam tão pouco familiares.

Ao subir no elevador panorâmico do escritório onde trabalhava, Beatriz se lembrou dos dias em que contava telhados por entre os vidros da janela do seu quarto. Teve vontade de chorar. Relembrar os dias em que seu coração ainda não tinha tantas cicatrizes, dias em que sua família ainda estava por perto, e quando ainda sentia o calor da segurança que seus pais transmitiam. Agora ela estava sozinha, e a única pessoa que a fazia lembrar do conforto que era ter uma família, tinha desaparecido como quem se teletransporta para outra galáxia. Como isso poderia ser possível? Um dia ele reclamava por ter que tomar banho com o sabonete com aroma de baunília dela, e como isso o deixava irritado, como é que ela não sabia comprar um mísero sabonete sem cheiro de comida. No outro dia ela se acorda sem ninguém resmungando no box do banheiro. Como pode ser possível perder alguém que era tudo na sua vida, e simplesmente não cair morta na mesma hora? Como ela conseguia respirar, ficar de pé e ir trabalhar? Como é que ela se atreve a ler um livro e caminhar viva pelas ruas? Como é que toda sua vida é sugada por um buraco negro e ela consegue estar de pé? A porta do elevador se abre, e Beatriz volta do seu devaneio ainda com os  olhos marejados.

Ela sai andando pelos corredores do prédio como que no piloto automático, vai até sua mesa, e desaba na cadeira. Pelas próximas oito horas ela teria uma bela válvula de escape para se entreter. Pilhas de papéis, prazos e projeto para entregar. Nada melhor que o trabalho para te fazer esquecer que você tem uma vida.

Aldrêycka Albuquerque

3 comentários:

Anônimo disse...

Drika parabénsssssssssssssss sou sua fã

kel

Iêda disse...

Que massa amiga, com certeza será um sucesso.

Parabéns, vou ser a primeira a comprar, viu?

Beijos

Dany palavras disse...

Escrevendo um livro? tenho certeza que será ótimo, só este começo me deu vontade de ler mais. Já gostei da Beatriz, ela tem um bom gosto lendo Austen e ainda mais o meu favorito Orgulho e Preconceito!!!
Bjos!!!