quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Uma carta à minha infância

Eu, em 1989, 2 anos.


Cara pequena,

Não perca tanto tempo planejando o implanejável, permita-se surpreender.

Não se cobre tanto, pelo menos não o tempo todo. Isso ao tempo que te faz melhor, também te desgastará com o passar dos anos.

Não segure as lágrimas quando elas vierem, mas tenha certeza que elas não são pelos motivos errados, pelas pessoas erradas.

Viva sua idade, não perca tempo desejando ser mais velha. O futuro não aguarda nada de fenomenal além daquilo que você anda plantando hoje, enquanto se sente desejosa pelos anos a frente.

Você SEMPRE será diferente. Aos 3, aos 8, aos 12 e também aos 23. Tentar se misturar a multidão, além de desgastante, será trabalho perdido. Aceite suas diferenças e conviva com elas de forma amigável. Não demore tanto pra entender isso.

Em certas coisas, você vai demorar mais tempo que os outros para vivenciar. Nada que você possa fazer vai mudar isso. Na verdade, é melhor que não tente mudar mesmo. Mas não se desespere, isso não vai te fazer melhor ou pior que ninguém. Só diferente. E isso não é ruim. Só diferente.

Cuide bem do seu coração. Não o entregue assim facilmente, não acredite assim tão piamente e, principalmente, não seja assim tão extremista. Do ódio até o amor existem nuances que podem valer a pena serem exploradas.

Quando aquela sua velha tristeza chegar perto, não ignore-a. Trate-a bem. Tente entendê-la, pois você irá ter que conviver com ela ainda por muitos anos.

Pare de discutir com o espelho, tudo tem seu tempo. Com os anos você vai passar a se aceitar, cada vez mais um pouquinho. Não vale a pena o desgaste, se com o tempo tudo se resolve.

Cuidado com as amizades. Se elas te cobrarem ser algo que você não é, nem quer ser, abra mão delas e siga em frente sozinha. Vá se acostumando, que sozinha você será por muitos anos.

Meta a cara e saia sozinha. Não espere a companhia de ninguém. O mundo não é tão assustador quanto parece. E a sensação de solidão no meio da multidão não é assim tão devastadora. Tem até sua beleza.

Controle seus instintos. Eles podem te trazer arrependimentos e embaraços sem tamanho.

Por mais maravilhoso que possa ser o futuro que você vai ter, ele nunca terá as cores, o aroma nem todo esse brilho que você sonha. Não quer dizer que você vai se frustrar, mas tente não desejar tanto. Não tão perfeito. Pois nada do que você vai planejar vai acontecer como você quis, ou no momento que você pensou. Mas no final tudo vai dar certo. Só não da forma que você pensou. Então não aposte tão alto assim neste futuro que você conjectura. Prefira viver melhor o seu presente.

Enfatizando ainda mais: viva bem hoje, para que vinte anos depois você não olhe pra trás e veja um monte de anos borrados, corridos, sem fôlego e sem muito sentido.

Você não é responsável pela sua família. Eles é que são responsáveis por você. Você não tem idade nem a obrigação de levar a estrutura psicológica de uma família inteira nas costas. Então, quando você se cansar de escutar, grite. Quando não quiser mais se calar, fale. Eles não são de vidro e você não é um poço fundo onde qualquer um pode chegar e jogar suas lamúrias. Você já tem seus problemas. Não compre os problemas de mais ninguém.

Nada na sua vida é permanente, então pare com essa mania besta de andar com sapatos de lã pelo cascalho. Fale o que pensa e duvide dos outros. Acreditar demais só vai te trazer prejuízos.

Você é chata por natureza mas com os anos isso vai atenuando. Então não se cobre tanto, não acredite quando sua mãe falar que você é insuportável. Você já suporta o mal humor de todo o mundo, então tem todo o direito de ser chata quando der na telha. Isso não vai te fazer uma pessoa pior. Com o tempo você vai entender seu mundo e a convivência será um troço mais fácil.

Dezessete não será uma idade mágica. Assim como vinte e três também não. Nenhuma idade é mágica. A cada ano acontecem maravilhas e desgraças em igual dose. Não se encante nem se venda pela possibilidade de um futuro melhor, mais  bonito ou alegre... Tente fazer isso hoje.

Quando te disserem que te ama, duvide. E quando disserem que te odeia, acredite. Não insista em ninguém. Ninguém. Siga em frente como você sempre fez. Com o tempo, toda dor passa.

Ainda sobre dores: nenhuma dor é tão grande que você não possa suportar. E nenhuma vai durar um segundo a mais que o tolerável. Elas passam. Por mais terríveis e permanentes que pareçam ser. Elas passam e depois não sobra nem o nome, ou a cor dos olhos. Passa e você nem sente falta depois.

O seu conceito de liberdade e independência estão furados. Encontre outro.

E o principal: faça seus planos e viva sua felicidade sozinha. Não espere por ninguém que não vai chegar. Se concentre na sua felicidade unitária. As demais coisas podem ser acrescentadas depois disso.


Aldrêycka Albuquerque

Nenhum comentário: